REFORMA DO CÓDIGO CIVIL PODE DEIXAR CÔNJUGE SEM DIREITO À HERANÇA

Foto: Pixabay/Splishire

O projeto de reforma do Código Civil propõe mudanças nas regras de herança que podem permitir que cônjuges ou companheiros deixem de ser considerados herdeiros necessários. Com isso, o responsável pelo testamento poderia excluí-los da sucessão patrimonial, algo que atualmente não é permitido pela legislação.

Como é hoje

Pelas normas atuais, o Código Civil classifica o cônjuge, os descendentes (filhos, netos, bisnetos) e os ascendentes (pais, avós, bisavós) como herdeiros necessários. Isso significa que metade do patrimônio de uma pessoa deve, obrigatoriamente, ser destinada a esses herdeiros, mesmo que exista testamento.

A outra metade pode ser livremente distribuída, por exemplo, a instituições ou terceiros, conforme a vontade expressa em testamento. A parte protegida por lei é chamada de “legítima”.

O que propõe a reforma

A proposta de reforma, apresentada em projeto que tramita no Senado, retira os cônjuges da lista de herdeiros necessários. O artigo 1.845 do projeto afirma: “São herdeiros necessários os descendentes e os ascendentes”, sem menção aos cônjuges.

Com isso, o testador poderá, caso deseje, excluir o cônjuge ou companheiro da herança. O artigo 1.850 estabelece que “para excluir da herança o cônjuge, o convivente ou os herdeiros colaterais, basta que o testador o faça expressamente ou disponha de seu patrimônio sem os contemplar”.

Segundo especialistas, isso abriria a possibilidade de destinar todo o patrimônio a terceiros, mesmo que o único familiar remanescente seja o cônjuge — o que não é possível sob as regras atuais.

Atualmente, só é possível excluir herdeiros necessários do direito à herança por motivos legais de “indignidade”, como envolvimento em homicídio (ou tentativa) contra o autor da herança, acusação caluniosa ou obstrução violenta ou fraudulenta ao acesso do autor aos seus bens.

Sucessão legítima permanece

O projeto não propõe mudanças na ordem da sucessão legítima, aplicada na ausência de testamento. Continuam sendo considerados, nessa ordem, os descendentes, ascendentes, cônjuge e colaterais. O artigo 1.838 da proposta mantém o entendimento de que, na falta de descendentes e ascendentes, o cônjuge pode herdar a totalidade dos bens.

Debate jurídico

Especialistas apontam que a proposta ainda está em fase inicial de tramitação e pode sofrer alterações. A presidente da Comissão de Advocacia de Família e Sucessões da OAB-SP, Silvia Felipe Marzagão, afirmou que o texto foi elaborado com pouca discussão e destacou a retirada do cônjuge como uma das principais mudanças.

Francisco Gomes Junior, sócio da OGF Advogados, também avalia que ainda é cedo para mensurar os impactos, pois o projeto poderá ser reformulado durante a tramitação.

O advogado Ilmar Muniz observa que, caso aprovada a proposta, a única forma de garantir herança ao cônjuge será por meio de testamento — prática ainda pouco comum no Brasil. De acordo com o relatório “Cartório em Números”, foram registrados 527 mil testamentos no país entre 2007 e setembro de 2024.

A proposta também introduz o conceito de herdeiros “vulneráveis ou hipossuficientes”, que poderiam receber até um quarto da herança por escolha do testador. Especialistas indicam que esse critério pode demandar maior atuação do Judiciário, por envolver interpretações subjetivas.

Tramitação

A proposta de reforma do Código Civil foi elaborada por uma comissão formada por 38 juristas, sob coordenação do ministro Luís Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). A comissão foi criada por iniciativa do então presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

O projeto propõe alterar 1.122 dos 2.046 artigos do atual Código Civil, além de incluir mais de 200 novos dispositivos. A tramitação começa com a criação de uma comissão especial no Senado, ainda sem data prevista para instalação. Após essa etapa, o texto seguirá para comissões permanentes, como a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), antes de ser analisado em plenário.

Com informações de UOL

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